Precisamos falar sobre o delivery

O diálogo aconteceu pelo WhatsApp. E foi mais ou menos assim:

_ Oh, Tininhaaaaaaaaaa!!! Você pode mandar um sanduíche aqui em casa pra mim? Tô com fome.

_ Vou fazer.

Em 20 minutos recebi na minha casa o melhor sanduíche do mundo, com a melhor maionese caseira e um coraçãozinho torto desenhado na embalagem. Ela não perguntou qual sanduíche eu queria. E mesmo assim, veio o certo, no tamanho e no tempero da minha preferência. E quentinho.

A Tininha toca seu negócio com a família há anos. É o famoso Trailer do Ilson, em Córrego Fundo, onde você pode se reunir com seus amigos no sábado à tarde, levar sua família para lanchar no domingo. Mas ela nunca esteve preparada para atuar no delivery. Ninguém estava. Não foi desse jeito que ela formatou o seu negócio. Mas precisou se adequar. Moldar seu modo de trabalho, seus custos, sua contabilidade. Engolir os prejuízos de tempo e dinheiro, como se engole um sapo de marcha à ré. Sem choro. E continuar a manter seu comércio, porque tem gente que depende dela. Sua família, colaboradores, fornecedores.

Para isso, ela não teve muito tempo para alinhar o sistema de entrega. Só que na prática, aquela que vale para a vida inteira, o delivery dela é perfeito. Elementar para esses tempos. Uma lembrança de que existe alguém que luta, que não parou, que acredita e que me manda coraçõezinhos tortos por delivery em um sábado à noite em que eu não terei outra companhia a não ser os roteiros frios da Netflix.

Igual a ela, outros também me mandaram recados neste labirinto em que estamos vivendo. Deliverys que me fizeram repensar o sentido da vida e a necessidade constante de entregar mais do que nos foi solicitado. Qualquer que seja a circunstância.

O Rafael do Restaurante Especiaria que me trouxe um tropeiro delicioso e um chocolate encorpado que me aqueceu em uma das noites mais frias desse ano. A Liliane da Santa Massa que sempre anexa um carinho nos pratos deliciosos que entrega. A Rê Art que mudou o ponto, mas não mudou sua forma corajosa de encarar a vida. A Sirlene que ajuda nas entregas, fortalecendo sua família nesses tempos difíceis. Todos eles, sem distinção, me mostram todos os dias que é preciso continuar. Não importa o inferno que estamos vivendo, é urgente nos mantermos de pé.

Óbvio que nenhum comércio desses estava preparado para o delivery. Nenhum teve tempo de se estruturar, fazer cursos, contratar pessoas. Eles tiverem que se adequar à força. Na forja louca da vida que não poupou absolutamente ninguém. E todos eles se superam todos os dias para fazer a melhor entrega, levar o melhor produto e, sobretudo, chegar em nossas casas com o melhor sorriso.

Por isso que eu digo que precisamos falar sobre o delivery. Não o serviço básico, com operador e sistema de entrega padronizado. E sim, esse que nasceu durante a pandemia, sem teoria e planejamento. Mas que mantém as características do negócio físico a que está vinculado e que é feito de pessoas que têm se esforçado ao extremo para entregar, junto com a comida quentinha e feita no capricho, boas-novas em nossos lares.

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